sexta-feira, 28 de maio de 2010

mordida cruzada dentiçao decidua




UNITERMOS: mordida cruzada, dentição decídua.



INTRODUÇÃO

Do ponto de vista da oclusão, cabe ao clínico e mais especificamente ao odontopediatra, identificar, diagnosticar e tratar precocemente algumas das maloclusões presentes nas crianças, já que o mesmo acompanha o paciente desde a mais tenra idade até a adolescência. Um conhecimento adequado sobre oclusão é o pré-requisito para se diagnosticar e tratar corretamente as interferências em crianças pré-escolares 5. Quando as crianças são tratadas durante a dentição decídua, o crescimento e desenvolvimento normais são mantidos 3, 11, 12.

Segundo WOOD 16, a mordida cruzada é uma relação anormal vestíbulo-lingual dos dentes da maxila ou da mandíbula, ou de ambos, quando em oclusão. Pode ser uni ou bilateral, anterior ou posterior.

Este trabalho tem por finalidade fazer uma breve revisão da literatura, bem

como apresentar um caso de mordida cruzada posterior funcional e seu respectivo

tratamento.



REVISÃO DA LITERATURA

MOYERS 9 definiu a mordida cruzada como a incapacidade dos arcos superior e inferior em ocluir normalmente em uma relação lateral, podendo ser decorrente de problemas de posicionamento dentário, de crescimento alveolar ou de uma grave desarmonia entre a maxila e a mandíbula. Segundo ele, alterações das bases ósseas, musculares, dentárias, traumatismos, perda precoce de dentes decíduos, hábitos de sucção e postura seriam alguns dos fatores que levariam à mordida cruzada. Ele ainda as classifica, baseado nos fatores etiológicos, em três tipos, a saber: 1) Dentárias: aquelas causadas por uma inclinação axial lingual de um ou mais dentes superiores; 2) Musculares ou Funcionais: originadas por uma adaptação funcional às interferências dentárias; e 3) Ósseas: decorrentes de alterações no crescimento ósseo, ou seja, crescimento assimétrico da maxila ou mandíbula, ou uma relação anormal entre ambos.

De acordo com WOOD 16, as mordidas cruzadas funcionais podem ser produzidas por: 1) interferências dentárias, 2) distúrbios têmporo-mandibulares e 3) uma assimetria dos arcos superior e inferior.

CHENEY 2 relata que interferências oclusais, ou seja, dentes mal posicionados, sensíveis ou traumatizados, perda prematura de dentes decíduos, dentes decíduos anquilosados, restaurações oclusais falhas e atividade anormal dos lábios levam a mordidas cruzadas funcionais.

O desenvolvimento de uma mordida cruzada é usualmente acompanhado por um desvio da mandíbula para o lado afetado quando do fechamento da boca 7.

A forma mais simples de mordida cruzada observada na dentição decídua ou

início da mista é aquela causada por interferências dentárias, especialmente dos

caninos decíduos 5. Em outros casos, as interferências podem ocorrer durante o processo de ajuste, na região de molares decíduos, mas os princípios básicos para o desgaste são os mesmos para ambas as regiões 5. Estas interferências podem levar a um desvio mandibular lateral e, em alguns casos, protrusivo. Como uma tentativa de se evitar estas interferências, o paciente desvia lateralmente a mandíbula, a fim de encontrar a posição de máxima intercuspidação. Esta mordida é denominada mordida cruzada posterior funcional.

SILVA FILHO e colab. 13, 1986, relatam que ao manipularmos a mandíbula em relação cêntrica, podemos verificar, quase sempre, que o comprometimento do arco superior é simétrico, ou seja, em cêntrica, existe uma mordida de topo bilateral, geralmente com contato prematuro dos caninos decíduos. Como este padrão de oclusão não oferece estabilidade, ocorre desvio da mandíbula buscando uma posição de conforto. Assim, as características desta mordida cruzada são: padrão unilateral, com desvio da linha média e cruzamento de todos os dentes após o canino.

MATHIAS 8, 1984, examinou 300 crianças, no município de São Paulo, com dentadura decídua completa, verificando quadros de maloclusão. No que se refere a mordida cruzada, a prevalência foi de 16,3%, e 75,5% dos casos apresentavam desvio de linha média.

As mordidas cruzadas posteriores não são auto-corrigíveis e se não tratadas, os molares e pré-molares permanentes erupcionam em mordida cruzada 10. KUTIN & HAWES 6 encontraram que de 48 pacientes com mordidas cruzadas posteriores não tratadas na dentição decídua, 44 deles apresentavam os primeiros molares e pré-molares permanentes erupcionados em uma relação cruzada.

WEST 15 encontrou que interferências funcionais não tratadas são mais comuns resultarem em maloclusões de maior complexidade do que qualquer outro tipo de problema na dentição decídua. Segundo ele, os objetivos do tratamento precoce na dentição decídua são: 1) remoção das interferências para a normalização da função e crescimento; 2) manutenção de uma função normal e 3) correção de desarmonias ósseas.

O tratamento precoce através somente do desgaste, ou em combinação com a expansão, é aconselhado para reduzir a prevalência das mordidas cruzadas 5, 6, 14 e, provavelmente, em alguns casos, eliminar a necessidade de tratamento em estágios posteriores do desenvolvimento da oclusão 5.



RELATO DE CASO

O paciente E. C. de 6 anos de idade foi trazido a clínica de pós-graduação da USC DE BAURU com história de trauma. No exame extra-oral, nenhuma anormalidade ou assimetria foi observada. Quando do exame intra-oral, constatou-se a ausência do incisivo central superior decíduo direito, em decorrência do trauma. Este paciente não apresentava lesões de cárie, apesar de possuir uma dieta com alta ingestão de carboidratos.

O exame de sua oclusão em uma relação cêntrica, revelou uma mordida cruzada posterior unilateral direita. As linhas médias superior e inferior não coincidiam; a linha média inferior desviava-se aproximadamente 2 mm para o lado direito em relação a linha média da maxila. Manipulando-se a mandíbula do paciente para uma relação de fechamento cêntrico, as linhas médias coincidiam. Entretanto, continuando-se o fechamento, ocorriam os primeiros contatos entre as cúspides dos caninos direitos decíduos. Após este contato prematuro, a criança completava o fechamento deslizando a mandíbula para a direita para poder entrar em oclusão cêntrica.

De posse dos modelos, comparando a largura transversal dos arcos dentários, observou-se que as medidas maxilares eram ligeiramente maiores do que as medidas mandibulares, sugerindo que não ocorria um estreitamento do arco superior. Após o diagnóstico de uma mordida cruzada posterior funcional unilateral, propôs-se o seguinte plano de tratamento: desgaste seletivo de caninos, superiores e inferiores, para se chegar ao equilíbrio oclusal.

Os desgastes foram feitos em ambos os caninos, direito e esquerdo, superior e inferior. Nos inferiores, o desgaste abrangeu as faces vestíbulo-distais, enquanto que nos superiores, as faces mésio-palatinas. Procedia-se o desgaste até que o paciente relatasse alguma sensibilidade. Neste momento, fazia-se uma aplicação tópica de flúor. No total, foram necessárias 3 semanas para se obter o equilíbrio oclusal.

Após atingir o equilíbrio, pediu-se ao paciente para fechar a boca em relação cêntrica, até atingir o primeiro contato oclusal. Este contato estava igualmente distribuído para ambos os lados, direito e esquerdo, com a linha média coincidindo. Portanto, através da utilização de um ajuste oclusal, eliminando-se as interferências, conseguiu-se levar o paciente a uma correta oclusão, com a correção da mordida cruzada funcional que o mesmo apresentava.



DISCUSSÃO

As mordidas cruzadas são maloclusões bastante frequentes, causando alterações no perfil do paciente quando não tratadas precocemente, uma vez que elas não são auto-corrigidas com a erupção dos dentes permanentes, como relatado por KUTIN & HAWES 6 e WEST 15.

As mordidas cruzadas funcionais são significativas a medida em que o deslocamento resultante do movimento do côndilo pode alterar o equilíbrio entre forma e função, podendo ser o fator etiológico no desenvolvimento de disfunções da ATM. MYERS e colab.10, encontraram que ambos os valores dos espaços vertical e horizontal medidos entre a cavidade glenoíde e o côndilo, foram significantemente menores no lado cruzado comparado ao lado não cruzado em crianças com mordida cruzada posterior funcional.

O diagnóstico de uma mordida cruzada depende de vários fatores, incluindo avaliação clínica oclusal, avaliação funcional comparando a relação de fechamento cêntrico com a oclusão cêntrica ou posição de máxima intercuspidação e a análise da dimensão do arco dentário que compara, especificamente, a largura de cada arco 13.

Diferentes métodos foram sugeridos para que o equilíbrio oclusal se auto-processe, incluindo a eliminação dos contatos prematuros que levam ao desvio 6, 14, diminuição no tamanho das coroas dos caninos decíduos e planos inclinados nestes dentes 5.

KISLING 5 sugere a confecção de planos inclinados com aproximadamente 45° com o longo eixo axial do dente, nas superfícies vestibular dos inferiores e palatina dos superiores. Além do mais, os planos inclinados oferecem à criança uma oclusão estabilizada na primeira posição de contato, bem como promovem um aumento na largura do arco superior e uma diminuição na largura do arco inferior.

O desgaste funcional pode ser justificado por duas razões: a primeira é que as interferências podem ser tão pequenas que o tratamento com expansor não é necessário; e a segunda, se houver atresia, a combinação do ajuste oclusal com o expansor pode levar a um resultado mais rápido do que a utilização isolada de um deles. Além do mais, a filosofia de desgaste funcional na dentição decídua deve ser mais largamente difundida, devendo ser feito em todos os casos onde uma pequena interferência de cúspide é diagnosticada, de modo a agir tão precocemente quanto possível, a fim de impedir a atresia do arco (processo de crescimento) 5.

Os dentistas não estão familiarizados com este ajuste oclusal e podem se mostrar hesitantes para desgastar de forma agressiva os dentes decíduos até removerem esmalte suficiente, a fim de proporcionar o ajuste do(s) dente(s) envolvido(s). As crianças também apresentam um desgaste natural dos dentes decíduos em um processo de ajuste oclusal natural 1.

Deve ser enfatizado que um minucioso diagnóstico deve preceder o tratamento ortodôntico, particularmente diferenciando entre um dente mal posicionado, alterações ósseas ou na ATM.

Quanto ao tratamento das mordidas cruzadas, todos os autores concordam que o mesmo deve ser precoce e sempre que possível deve-se interceptá-las na fase de dentição decídua, antes que problemas mais graves se instalem nas dentições mista e permanente, dificultando o tratamento posterior 1, 3, 4, 15. Na maioria destes casos, a eliminação dos contatos prematuros, precocemente, principalmente na região de caninos, é suficiente para promover a correção espontânea da mordida cruzada posterior funcional.



CONCLUSÕES

1- A análise funcional da oclusão é uma ajuda válida para o diagnóstico de interferências dentárias que levam a alterações oclusais.

2- Um correto diagnóstico e o conhecimento sobre o crescimento e desenvolvimento infantil capacita o odontopediatra a interceptar as maloclusões em uma idade precoce. A correção dos problemas funcionais permitirão o crescimento e desenvolvimento normais e podem simplificar qualquer necessidade de tratamento ortodôntico futuro.

2 comentários:

  1. Por isso é tao importante uma avaliçao ortodontica. Para corrigir ou interceptar problemas ortodonticos.
    A partir dos 6 anos ou da primeria troca de dentes.

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  2. OLÁ, MINHA FILHA TEM 1 ANO E 8 MESES E DESDE DO NASCIMENTO DO SEU 1ºDENTINHO OBSERVEI QUE ELA POSSUI MORDIDA CRUZADA ANTERIOR, MAS, O DENTISTA FALA PRA ESPERAR ATÉ ELA COMPLETAR DOIS ANOS E PARA UMA NOVA AVALIAÇÃO, O QUE FAZER? ESPERAR? SABE-SE QUE O TRATAMENTO PRECOCE É O MAIS INDICADO...QUANDO COMEÇAR O TRATAMENTO E COMO É FEITO EM BEBÊ DESSA IDADE?
    OBRIGADA

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